Quando se fala sobre relações de trabalho, é comum pensar apenas no básico: o funcionário trabalha, e a empresa paga. Mas quem trabalha com comunicação interna, endomarketing ou RH sabe que é muito mais do que isso. Essa relação entre funcionários e a organização é um verdadeiro jogo de expectativas, confiança e colaboração – e a maneira como comunicamos tudo isso faz diferença.
Escrevi este post especialmente para falar sobre o conceito de Employee-Organization Relationship (EOR) e entender o valor disso para quem trabalha com Comunicação Interna e RH. Mais do que só cumprir contratos, o EOR fala de criar um ambiente onde expectativas são geridas com clareza e onde as pessoas se sentem valorizadas. E vou te ajudar transformar ideias em ações práticas que realmente fazem diferença no dia a dia.
Se preferir, antes de ler tudo, assista ao vídeo abaixo que produzi especialmente para explicar alguns conceitos muito interessantes sobre a relação com os funcionários. E, claro, não deixe de se inscrever no canal para acompanhar conteúdo especializado em comunicação organizacional e muito mais.
O que é Relação Funcionário-Organização (EOR)?
A relação entre colaborador e organização (também definida pela sigla em inglês EOR) é uma “relação de troca entre o funcionário e o empregador”, nas palavras de Tamara L. Gillis, professora de comunicação da Pennsylvania (EUA). Ou seja, envolve uma expectativa mútua: cada parte dá algo e recebe algo em troca. Isso abrange não só o trabalho em si, mas também o suporte organizacional, oportunidades de desenvolvimento e o clima de respeito e confiança.
No Brasil, o conceito de EOR ainda é pouco discutido, mas é fundamental para compreender como as dinâmicas entre funcionários e empresas afetam o ambiente de trabalho. Um dado interessante é que mais de 70% das empresas, sejam pequenas (com menos de 1 mil colaboradores) ou grandes (com mais de 5 mil colaboradores), concordam que o maior desafio da comunicação interna é “engajar as lideranças como comunicadores”.
Isso mostra a necessidade de que os líderes assumam um papel mais ativo na comunicação interna para fortalecer a conexão com os colaboradores e promover um ambiente de trabalho mais engajado. E a EOR lida com exatamente com o equilíbrio entre o que o empregado espera da empresa e o que a empresa espera do empregado.
Portanto, podemos entender a EOR como um conjunto de expectativas entre a empresa e seus funcionários. Esses contratos podem ser formais (contratos assinados) ou informais (interações diárias).
Em um artigo bem interessante, Shore explica que “o empregador geralmente define a maior parte dos termos do contrato formal de emprego, enquanto os funcionários baseiam suas percepções no suporte percebido e na experiência de trabalho”. Percebe a diferença?
Como a comunicação afeta a EOR?
Um ponto claro na EOR é que a comunicação é fundamental para o sucesso ou fracasso dessa relação. A maneira como a empresa se comunica com seus funcionários pode tanto fortalecer quanto prejudicar as expectativas de ambas as partes.
Como eu sempre defendo, comunicação clara e objetiva reduz mal-entendidos e cria um ambiente mais justo e positivo. Quantas vezes um e-mail mal interpretado ou uma instrução fraca e sem detalhes já não causaram problemas na empresa onde você trabalha?
Segundo Ann Yan Zhang, professora PhD de psicologia em uma universidade chinesa, “a relação entre um empregado e seu supervisor imediato é a chave para as percepções do funcionário sobre a EOR”. Ou seja, supervisores que aplicam políticas de maneira justa e transparente tendem a gerar mais engajamento e satisfação.
Assim, a liderança transformacional – que promove uma comunicação de mão dupla e o empoderamento individual – tem um impacto positivo considerável nos resultados da EOR.
Partindo da tese de que a comunicação exerce um extraordinário poder para o equilíbrio, o desenvolvimento e a expansão das organizações, Gaudêncio Torquato discute conceitos fundamentais para a boa comunicação nas empresas – sejam elas públicas ou privadas -, além de apresentar casos reais para análise. Obra fundamental para profissionais e estudantes.
Conceitos da Relação Funcionário-Organização
Para entender melhor essa relação, é interessante destacar quatro conceitos fundamentais que são amplamente discutidos por diversos especialistas da área, como Rousseau, Graen, Uhl-Bien, Eisenberger e Seers – deixei todas as referências no fim deste artigo. Esses conceitos oferecem uma boa base para compreender as nuances da relação entre funcionário e organização. Olha só:
- Contrato psicológico: refere-se às expectativas não escritas que o funcionário tem sobre a organização, como reconhecimento, boas condições de trabalho e respeito mútuo (Rousseau, 1995).
- Troca líder-membro: sobre o relacionamento entre o funcionário e seu chefe imediato. A qualidade dessa relação influencia diretamente a satisfação do funcionário e a sua percepção de seu papel na organização (Graen & Uhl-Bien, 1995).
- Suporte organizacional percebido: é o quanto o funcionário sente que a empresa valoriza o seu bem-estar e contribuições. Isso é essencial para promover engajamento e satisfação no trabalho (Eisenberger et al., 1986).
- Troca entre membros da equipe: analisa as relações entre colegas de trabalho. O suporte mútuo e a colaboração são fundamentais para o sucesso coletivo (Seers, 1989).
Esses conceitos mostram que a qualidade das interações no ambiente de trabalho vai muito além do cumprimento de tarefas: são os pequenos gestos, as trocas de apoio e a percepção de ser parte de uma equipe que fazem a diferença para criar um ambiente de trabalho saudável, agradável a todos e, principalmente, produtivo.
4 tipos de relação entre funcionário e empresa
Quando falamos de EOR, é possível identificar quatro tipos principais de relações que podem surgir entre um funcionário e sua empresa. Essa ideia de classificar os tipos de relação foi apresentada por Anne S. Tsui e outros autores no artigo Alternative Approaches to the Employee–Organization Relationship (1997).
Achei interessante e vou resumir na tabela a seguir para servir como um guia para suas estratégias de comunicação interna e endomarketing, mas expliquei tudo isso em detalhes no vídeo que deixei no início deste artigo, se preferir algo mais completo.
TIPO DE RELAÇÃO | DETALHE |
---|---|
Contrato Simples e Direto | Relacionamento básico e equilibrado, com troca de curto prazo. O funcionário faz o que foi pedido e recebe exatamente o combinado. |
Investimento Mútuo | Tanto a empresa quanto o funcionário investem um no outro. Envolve tarefas além do esperado e treinamento em troca. |
Subinvestimento | O funcionário é exigido além do contrato, mas não há compromisso de longo prazo ou incentivos significativos do empregador. |
Superinvestimento | O papel do empregado é limitado, mas a empresa oferece treinamento e desenvolvimento de longo prazo, comum em setores públicos. |
Você consegue identificar o tipo de relação que sua empresa tem com os funcionários? Esses tipos de relação ajudam a entender como a empresa e o funcionário podem interagir e alinhar expectativas.
Compreender esses modelos possibilita aplicar estratégias mais direcionadas para melhorar o engajamento e a satisfação dos colaboradores, ajustando as práticas de comunicação interna e liderança conforme cada tipo de relação.
As organizações, como partes da sociedade, são diretamente afetadas por mudanças de cunho social, econômico e político. Em consequência disso, sua comunicação deixa de ser apenas técnica e instrumental para tornar-se estratégica. Apesar das incertezas globais, as ações de comunicação precisam ser planejadas com base em pesquisas científicas e na análise/interpretação de dados. Nesse contexto, é preciso trabalhar com a comunicação integrada, conjugando, de forma sinérgica, a atuação de relações públicas com a comunicação institucional e a comunicação interna, assim como a atividade de marketing com a comunicação mercadológica. Nesta obra, esse tema é analisado de diferentes óticas. A primeira parte, “Comunicação organizacional no contexto da sociedade contemporânea”, aborda, entre outros temas, as mudanças nas formas de democracia no Brasil e na América Latina, a comunicação digital contemporânea e a responsabilidade social na concessão de serviços públicos.
Orientações práticas para profissionais de Comunicação Interna
Agora quero dar algumas dicas para os profissionais de comunicação interna e RH que precisam melhorar a EOR. É preciso seguir uma abordagem estratégica, com práticas que possam ser aplicadas no cotidiano organizacional. E aqui estão algumas sugestões para fortalecer a relação entre funcionários e empresa, anote aí!
- Promova a transparência: comunicação transparente é essencial para reduzir desconfianças. Compartilhar informações sobre decisões importantes da empresa e explicar os motivos por trás dessas decisões ajuda os funcionários a se sentirem parte do processo e melhora a confiança na liderança.
- Fomente a comunicação de mão dupla: estimule os funcionários a darem feedback e garantam que suas opiniões sejam ouvidas. Crie canais para facilitar esse feedback, como caixas de sugestões, pesquisas de clima organizacional e reuniões regulares.
- Treine a liderança: capacite os líderes e supervisores para que sejam bons comunicadores. Como vimos anteriormente, supervisores são o elo mais próximo dos funcionários e têm grande influência na percepção que os colaboradores têm da empresa. Treinamentos em comunicação clara, escuta ativa e inteligência emocional podem fazer grande diferença.
- Celebre conquistas: reconheça e celebre as conquistas da equipe e individuais. Mostrar apreço pelo trabalho bem feito fortalece o contrato psicológico e aumenta o sentimento de valorização dos funcionários.
- Comunicação direcionada e personalizada: diferentes equipes e indivíduos podem precisar de abordagens distintas. A comunicação personalizada ajuda os funcionários a se sentirem valorizados e reconhecidos. Isso pode incluir mensagens adaptadas a diferentes níveis da organização ou o reconhecimento de momentos importantes, como aniversários.
- Facilite a integração e cooperação entre equipes: promova atividades que incentivem a colaboração e interação entre as equipes, como workshops interdepartamentais ou eventos sociais. A qualidade das relações entre membros da equipe é importante para o sucesso de todos.
O impacto da EOR dentro e fora da organização
A qualidade da relação EOR afeta não só a vida dentro da empresa, mas também como a organização é vista fora dela. Funcionários satisfeitos são os melhores “embaixadores” da marca, enquanto empregados insatisfeitos podem desencorajar potenciais candidatos e prejudicar a reputação da empresa.
Isso vale tanto para empresas privadas quanto para estratégias de comunicação de ONGs e outros setores. A qualidade da EOR pode determinar o sucesso de parcerias, o interesse de doadores e até a imagem da empresa na comunidade (Kuvaas, 2008).
Em resumo, a relação entre um funcionário e sua organização é complexa e cheia de nuances.
Ou seja, entender os tipos de relações que podem existir e como a comunicação afeta essas relações é necessário para melhorar o ambiente de trabalho e garantir uma colaboração mais produtiva. Por isso, investir em boas práticas de comunicação e em relações mais equilibradas é o caminho para aumentar o engajamento, a satisfação e o sucesso de todos os envolvidos.
Fique à vontade para compartilhar sua opinião e experiência no espaço de comentários e conferir as referências que usei para produzir este artigo. Também te convido e checar mais conteúdo aqui no blog, sobre variados temas de comunicação para empresas e outros assuntos que podem te interessar.
Referências:
- GRAEN, G. B.; UHL-BIEN, M. Relationship-based approach to leadership. The Leadership Quarterly, v. 6, n. 2, p. 219-247, 1995.
- KUVAAS, B. An exploration of how the employee–organization relationship affects employee outcomes. Journal of Management Studies, v. 45, n. 1, p. 1-25, 2008.
- ROUSSEAU, D. M. Psychological contracts in organizations: Understanding written and unwritten agreements. Thousand Oaks, CA: Sage, 1995.
- SHORE, L. M.; COYLE-SHAPIRO, J. A.; TETRICK, L. E. The employee–organization relationship: A timely concept in a period of transition. Research in Personnel and Human Resources Management, v. 23, p. 291-370, 2004.
- TSUI, A. S.; PEARCE, J. L.; PORTER, L. W.; TRIPOLI, A. M. Alternative approaches to the employee–organization relationship: Does investment in employees pay off?. Academy of Management Journal, v. 40, n. 5, p. 1089-1121, 1997.
- ZHANG, A. Y.; TSUI, A. S.; SONG, L. J.; LI, C.; JIA, L. How do I trust thee? The employee–organization relationship, supervisory support, and middle manager trust in the organization. Human Resource Management, v. 47, n. 1, p. 111-132, 2008.